Mercados Internacionais em Perspectiva – Segmentação

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Mercados Internacionais em Perspectiva – Segmentação

Antes de iniciarmos o papo sobre mercados internacionais, é interessante definir exatamente o que é mercado. Segundo Porter, “mercado” é o conjunto de todos os compradores reais e potenciais de um produto e/ou serviço. Seguindo por essa linha de raciocínio, então, o mercado da empresa exportadora seria o planeta inteiro. E, como já sabemos, “o mercado é soberano, ele define o produto, o serviço e o preço. Cabe às organizações buscar posição competitiva para atingir seus objetivos estratégicos. Não existe fórmula. Existe tentativa” (Carvalho).

Mas seria correto afirmar que uma única empresa seria capaz de atingir todas as diferentes necessidades e respostas de todos os distintos grupos de compradores mundo afora? Certamente que não – nem a magnânima Coca-Cola conseguiu tanto. Que dizer de nossas empresas com orçamento de marketing muito reduzido em comparação… Teoricamente haveriam consumidores para qualquer produto em qualquer país, mas esses nem sempre estarão em número suficiente para viabilizar os investimentos de prospecção de mercado e produção. Assim, fica evidente a necessidade de segmentação do mercado; qualquer que seja ele.

Segmentação ?!? Definimos, segundo Kotler: “divisão de mercado em populações de clientes que apresentam certas características similares”. É impossível prestar serviços igualmente excelentes a todos os clientes imagináveis; daí a necessidade de segmentar.

Como segmentar? Existem inúmeras formas de segmentação em qualquer mercado. As mais comuns são: geográfica (região, clima, etc.); demográfica (idade, sexo, renda, religião, raça, nacionalidade, etc.); psicográfica (classe social, estilo de vida, personalidade); e comportamental (benefícios, atitudes, grau de lealdade, etc.).

Esses pontos estando definidos, podemos começar a falar de expectativas para 2004. Lógico que 1) cada ponto abordado deve ser traduzido à realidade da empresa, e 2) em se falando de mercado, tudo é relativo. Vizentini faz uma análise pessimistas das relações internacionais para 2004, baseado na estabilidade (ou falta de) americana, em ano de eleição, decorrente dos conflitos armados anteriores. Entretanto, com ou sem estabilidade política internacional, com ou sem conflitos, com ou sem segurança e/ou incerteza, e parafraseando Freddie Mercury: o show deve continuar!

Uma rápida pesquisa mostra que o esforço global continua à toda força. No início da década em que as exportações do Brasil dobraram, os EUA continuam sendo o maior destino das exportações brasileiras, seguido de perto pela China. Em face às negociações da Alca, o União Européia tenta uma maior aproximação com o Mercosul. Os mercados árabes estão se abrindo, e o Brasil tenta estreitar as relações. O mesmo é válido para boa parte do mercado africano, e a maior parte do asiático. Nesse sentido, as câmaras bilaterais têm feito um bom trabalho de divulgação e contatos. 

Contudo, enquanto o Brasil comemora, ao final de 2003, a duplicação do volume de exportações em comparação com 1993 (devido, principalmente, ao agronegócio), a China têm crescido 7 a 9% a.a. e duplicou seu PIB no mesmo período (questões sociais à parte). Em comparação, o México cresceu 46% desde sua entrada no Nafta (1991). Atualmente, o Brasil é responsável por menos de 1,2% de todo comércio internacional, apesar de ser o 5º maior país do mundo em extensão territorial, e o maior mercado consumidor da América Latina.

É claro que o esforço feito pelo governo federal para abrir formalmente novos mercados têm mostrado algumas surpresas aos exportadores brasileiros. Talvez ainda leve algum tempo para que as linhas de comércio entre o nosso e esses outros países sejam formalizadas, ou funcionem à velas cheias, mas o importante é que as opções estão se expandindo, e com elas se expandirá (assim esperamos) nosso volume de exportações.

Em termos gerias (bem gerais), os mercados americano e chinês, devido a seu tamanho, podem absorver boa parte de tudo o que lhes é oferecido – razão pela qual a grande maioria dos esforços de venda são dirigidos para esses países. Mas a operação não é automática – é preciso cuidar muito da qualidade, quantidade, prazo de entrega, preços e pós-vendas.

Já os mercados europeus (tratemos a União Européia como uma série de países com culturas distintas, e não um único mercado consumidor) são muito mais complexos. Além de menores, têm uma segmentação mais complexa e públicos bem distintos. Enquanto o público inglês tende a ser mais americanizado, os países da Europa Continental tendem a manter mais vivas suas tradições e identidade cultural. Os países do leste europeu, contudo, enquanto reconstruindo suas economias depois do colapso da União Soviética, são muito mais abertos ao novo.

Os mercados árabes, por sua vez, despontam como as novas estrelas. Importando desde artigos básicos até produtos de alto valor agregado (sempre respeitando as características e preferências locais – bem heterodoxas a nossos olhos), poderão representar uma parcela significativa das exportações brasileiras nos anos por vir.

Os mercados asiáticos, contudo, tomam uma posição de frente face às exportações, tornando-se os maiores competidores do Brasil em inúmeros produtos – desde móveis até têxteis, passando por eletro-eletrônicos e peças de reposição. É claro que, como já fizemos referência no início desse artigo, ninguém pode ser o melhor em tudo, então seu mercado ainda carece de muitos produtos em que o Brasil é competitivo – desde produtos do agro-negócio até metal-mecânico. A Rússia (devo colocá-la aqui ou no parágrafo da Europa?), em se tornando capitalista como o resto de nós, oferece mais um mercado consumidor gigantesco, que mal começou ser explorado!

No mercado africano, então, em se tratando de contrastes, temos praticamente todos. Desde uma África do Sul bem desenvolvida até uma Etiópia quebrando recordes de sub-nutrição. Governos militares ou liberalistas; guerras civis entre tribos; o país mais corrupto do mundo (Nigéria), e um sem-número de ações humanitárias convivem com uma classe média lutando por desenvolvimento econômico, numa tentativa de aplicação da cultura capitalista. Mas nem só com espinhos segue essa descrição: a falta de indústrias de ponta abre caminho para toda sorte de produtos, e as oportunidades estão lá para quem quiser agarrá-las. Convenhamos: nossa estimada Marcopolo não teria se instalado em um mercado inseguro!

Finalmente, nossa volta ao mundo no traz de volta à América, onde a palavra do dia é “Alca”. E nem poderia deixar de ser: depois do malogro que se provou o Mercosul (a indústria calçadista que o diga, depois da quebra da Argentina), todo mundo está se voltando para mercados mais estáveis – e que melhor que vender para o grandioso mercado americano? Deixemos para outra oportunidade a discussão a respeito da “faca de dois gumes”…

Continuando as escalas em preparação para nossa volta ao mundo em 80 artigos, chegamos ao terminal que provoca as discussões mais estimulantes nas classes que leciono: a “cultura”.

Antes de mais nada, contudo, devemos definir esse que é um dos pináculos do estudo da Antropologia, e que forma a base de todo e qualquer povo. Paul Claval define cultura como “o conjunto complexo dos códigos e padrões que permeiam e regulam a ação humana individual e coletiva, tal como se desenvolvem em uma sociedade ou grupo específico, e que se manifestam em todos os aspectos da vida”.

Tarefa muito mais complexa do que uma definição acadêmica, contudo, é entender as diferentes nuanças de cada cultura distinta, e, mais importante, como devemos nos relacionar com elas. Quem já visitou outro país e se deparou com situações de choque cultural entenderá a que me refiro. Se nosso modo de vida é diferente de nossos vizinhos de cidade e estado, o que dizer de povos em países do outro lado do globo ?!

Nenhuma receita de bolo aqui. E como se não bastassem as dificuldades de entender as linhas de raciocínio de outros povos, existe ainda a crescente “americanização do mundo” provocada pela globalização financeira e pelo advento da internet, conforme defendida por Eric Schlosser. Qual a profundidade da influência norte-americana sobre a vida de outros povos, e que alterações essa provocará em seus aspectos comportamentais? A rede de nós a serem desatados a fim de entender esse turbilhão chamado cultura cresce exponencialmente.

Os erros mais comuns em termos de sensibilização cultural são a estereotipia e a caricatura de outros povos. Somos 6,4 bilhões de pessoas (em uma taxa crescente de umas 2 pessoas por segundo), distribuídas em uns 200 países ao redor da mesma esfera espacial – e nenhum de nós é igual ao próximo. Um exercício rápido: Responda à pergunta “o que define o povo brasileiro?”. Você provavelmente pensará em pobreza, carnaval, futebol… A visão que se iniciou com a promoção do país pela Embratur na década de 60, e é reforçada ainda hoje. Agora responda: Você se encaixa nessa definição? Aí está. Não conseguimos nem nos definir como brasileiros! Como esperamos definir povos que nem conhecemos?

Existe, contudo, uma caixa de ferramentas para definir os principais aspectos das culturas estrangeiras. Dentre essas, citamos os principais pontos a serem analisados (todos muito subjetivos):

  • Níveis de cosmopolitismo e heterogeneidade da população
  • Níveis de extroversão e/ou introversão da população em geral
  • Noções de tempo e espaço;
  • Relação entre poupança e natureza (aplica-se aqui a Teoria dos Climas, de Montesquieu);
  • Religiosidade e sua influência no cotidiano
  • Senso de humor e distância de poder
  • Visão de presente, passado e futuro; e Nacionalismo

Todos esses itens, contudo, somente quando avaliados em conjunto, promoverão Padrões de Previsibilidade Comportamental que nos possibilitarão ter idéia do que esperar de nossos anfitriões ou hóspedes. Dentre esses, destacamos:

  • Atenção e importância ao respeito pessoal e à autoridade
  • Níveis de identificação pessoal, empatia e proximidade emocional
  • Valores sociais e sintonia
  • Língua
  • Tradições e Costumes

É imprescindível, para a empresa que deseja internacionalizar-se, entender e respeitar a cultura de seus clientes e parceiros, a fim de maximizar as possibilidades de sucesso do negócio. Um simples gesto, como saber que no oriente deve-se receber um cartão com ambas as mão, lê-lo com atenção e deixá-lo sobre a mesa durante a reunião pode não mudar o curso de uma negociação, mas certamente será bem visto por seus clientes. Ah, falando nisso, “obrigado”, em chinês, pronuncia-se “siê siê”. Nos próximos artigos abordaremos cada país e suas idiossincrasias separadamente.

Fernando Dourado Filho considera que o Brasil melhorou muito nos últimos anos sob os mais variados ângulos. Constata, porém, que nossa competitividade exportadora encolheu tremendamente e, mais grave ainda, não tem figurado na agenda de preocupações de Brasília, indício candente de nossa introspecção e abulia.

Samuel Huntington atropela a noção de Estado-Nação e define a história como uma guerra sucessiva de blocos civilizacionais. Cita as civilizações ocidental, muçulmana, budista, hindu, chinesa, japonesa, cristã-ortodoxa, latino-americana e africana. Vez por outra, da mesma forma com que o desencontro das placas tectônicas provoca terremotos, as civilizações entram em choque e acontecem as guerras. Esperamos que possa ser superada o que dessa noção se aplica a nossos negócios internacionais.

Quem sabe uma nova geração de traders multiculturais, de cabeça efetivamente internacional, não possa aportar ao mundo uma efetiva mensagem de que, contrariamente aos vaticínios que emanam do próprio poder executivo, já não somos mais uns caipiras globais, perdidos na selva da economia globalizada?

“A notícia do assassinato do presidente norte-americano Abraham Lincoln, em 1865, levou 13 dias para cruzar o Atlântico e chegar à Europa. A queda da Bolsa de Valores de Hong Kong (outubro-novembro/97), levou 13 segundos para cair como um raio sobre São Paulo e Tóquio, Nova York e Tel Aviv, Buenos Aires e Frankfurt. Eis ao vivo e em cores, a globalização“ (Clóvis Rossi – Conselho Editorial da Folha de São Paulo)

Senhores passageiros, por gentileza coloquem as poltronas na posição vertical e observem os avisos de apertar cintos. Chegamos ao destino de nossa viagem – considerado por alguns o píncaro dos estudos de relações internacionais: a integração político-econômica !!

A ex-Primeira-Dama e atual Senadora Hillary Clinton cunhou o termo “Aldeia Global”, metaforizando a crescente interdependência entre os povos e países. Efetivamente, as práticas neoliberalistas, com a desregulamentação dos mercados e o predomínio de interesses financeiros por parte da empresas e governos provocaram um descompasso entre os volumes de produção e consumo, que culminou na necessidade de exploração de novos mercados para escoar esse excedente – daí o início da queda das barreiras comerciais, e as raízes da globalização.

Considerando que mais de 30% de todas as trocas comerciais diárias em todo o mundo tem como vértice uma única nação (os EUA), é fácil entender porquê os países uniriam-se em blocos para se fortalecer e proteger contra alguma “ameaça” externa (seja ela de segurança, política, econômica, financeira, …). Hoje existem em torno de 15 “Blocos Econômicos” (sem contar a Alca, que ainda não foi formalizada). As características mais comuns entre os países de um bloco são proximidade geográfica ou fluxo de capital e insumos (bens, serviços, equipamento, …).

Isso não quer dizer, contudo, que dentro de um mesmo bloco os mercados tenham perdido suas características individuais – pelo contrário: o bloco econômico, seja ele uma união econômica (como é o caso da União Européia), uma união aduaneira, um mercado comum, ou uma simples zona de livre comércio (como iniciou-se o Mercosul), mantêm ainda todas as diferenças de mercados distintos, com suas respectivas idiossincrasias e segmentações. A abordagem de cada mercado deve levar em conta todos esses detalhes – desde a legislação vigente até as diferenças culturais.

Informações mais específicas podem ser encontradas em www.cic-caxias.com.br, secção Links, item “Países e Mercados”. Até a próxima !!